O filósofo não se afasta das realidades quotidianas para filosofar; ao contrário, afasta-se da forma desatenta com que tratamos estas realidades. O mirandum (admirável), que os gregos chamavam de princípio do filosofar, não é suscitado num encontro com o incomum e o anormal, mas por um encontro incomum com o comum e rotineiro, e um anormal assombro com o normal dia-a-dia.
A simplicidade deste cuidadoso encontro com o corriqueiro, Pieper encontra-a registrada na mais rica tradição filosófica. De fato, para ele, não somente Platão e Agostinho, senão também Aristóteles e Tomás desconheciam estar na terminologia especializada o ato basilar do verdadeiro filosofar. Com efeito, é na simplicidade – que reside na atenta consideração das experiências mais comuns da vida – que se encontra, segundo Pieper, o ato fundante de todo autêntico filosofar e o selo de credibilidade de qualquer filósofo. Por conseguinte, a linguagem comum deve ser o “garimpo” de todo filósofo.
Na verdade, a própria palavra precisão, em filosofia, tem pouco sentido. O filosofar, justamente porque busca o todo, encontra-se dispensado das cisões próprias às ciências particulares. De fato, “pre-cisão” vem de cisão, que significa corte. Portanto, prescindir – “pré-cindir” – é fechar-se, de antemão, a um aspecto da realidade que não pode ser omitido por aquele que busca o todo, isto é, pelo filósofo. |